A espera do Outro e a esperança em Mim

* Por Ednei Germano Silveira
Estamos à mercê dos acontecimentos, e esses acontecimentos se tornam uma espera a medida que colocamos importância e relevância nesses acontecimentos. Esperamos ao menos logo pela manhã que tenhamos um bom dia no trabalho, na escola, na família, nos relacionamentos e na vida de modo geral. Esperamos, justamente por dar importância as coisas, as pessoas, aos fatos. Percebe-se que aquilo que não aplicamos importância, nem sequer assimilamos, percebemos ou tomamos conhecimento, pois se torna irrelevante por ser algo que está fora da nossa classificação automática das coisas, daquilo que nos importa.
Os acontecimentos são gerados pelas ações e é preciso a interferência humana nos fatos. Para tanto, esperamos os acontecimentos, seja de forma consciente ou inconsciente, pois tudo é feito através dos acontecimentos, das ações humanas.
A espera de acontecimentos parte de um para o outro, ou seja, essa espera se dá no outro, esperamos do outro para o eu. A aplicação da espera é o desejo que temos no outro, que se faça em nós aquilo que desejamos.
Esperamos que sejamos atendidos coletivamente ou individualmente. E essa espera pode ser aguardar, ter esperança, imaginar, supor, achar, contar com, estar reservado para, estar à espera de algo, ficar à espera, manter-se em expectativa, esperar por uma coisa impossível, duvidosa, difícil de obter e tantas outras. Na maioria das vezes, esperamos tudo isso no outro, nem que para isso se faça necessário fugir da realidade, se fechar para as possibilidades e não avaliar o contexto da espera.
Estamos vivendo num tempo, que aludindo a análise de Weber (1993) sobre a modernidade como desencantamento do mundo produzido pela nova racionalidade, falou-se da pós-modernidade como “o desencanto do desencanto”. O que vivemos hoje, ao invés de paz social, comportamentos racionais e felicidade pessoal, uma terrível guerra que devasta em vários sentidos, uma instabilidade política e terríveis violências. Somos violentos sobretudo no outro, transferimos todo o impacto causado pelas mazelas sociais, seja a guerra urbana ou a instabilidade política, seja a preservação de si ou intolerância desmedida, mas que revela exatamente a frustração com relação à modernidade.
Em tempos de guerra como esperar a paz? Ou em pleno terror esperar a cura? (Jr 8:15). É possível ver dois caminhos, sendo um a espera no outro, ou espera na esperança.
A paz é esperada no outro, o homem olha para o outro esperando que se faça a paz, mas em si é incapaz de praticar a paz. Em sua espera de paz se faz guerra. Queremos que os outros façam paz, façam o que é correto, façam o que é justo e que é dever de todos os homens. Mas somos incapazes de praticar tais esperas, somos irredutíveis quanto a postura de assumir em si a responsabilidade de aplicação pessoal, e transferimos para o outro aquilo que é dever de cada um.
Parece que os dias atuais não reúnem condições necessárias para a paz, para a saúde, para o diálogo, para a justiça, para felicidade. Mas a superficialidade gera justamente a noção de espera e espera no outro. Vê-se o contrário proposto pela modernidade, como reforça Gutiérrez (2003) que as tecnologias e avanços científicos pudessem trazer uma proximidade de si para o outro, mas que afastam devido a competitividade gerada na busca pela satisfação pessoal, pela satisfação do eu.
A esperança pode ser algo positivo em meio as indiferenças humanas, justamente por trazer um conforto de que a espera pode ser recompensada no futuro. Mas a esperança deve ser justa e legítima em seu fundamento, pois caso ao contrário transformará em frustração e seguirá num viés egocêntrico. A esperança deve ser justamente a condição necessária para suportar os ataques que na modernidade sofremos, e apontar para o alívio futuro que nos dará a condição de não mais esperar no outro, mas dar de si ao outro. É o que nos dará um novo padrão, uma nova direção, um sentido que não será pautado na espera do outro, mas na ação de si. Despertará o desejo para com o outro, e a direção será do eu para o outro. “O Desejo do Outro, que nós vivemos na mais banal experiência social, é o movimento fundamental, o elã puro, a orientação absoluta, o sentido”. (LÉVINAS, 2012, p. 49).
Quando a espera pela paz e o desejo pela cura, for o sentido em nós, teremos a responsabilidade de dirigir ao outro, com a condição necessária para a formação de uma sociedade e relações humanas, sendo no outro o que desejamos em nós. A esperança não terá o papel de futuro para ser justamente o presente esperado de outrora.
REFERÊNCIAS
GUTIÉRREZ, Gustavo. Onde dormirão os pobres? 3. ed. São Paulo: Paulus, 2003.
LÉVINAS, Emanuel. Humanismo do outro homem. 4. ed. Petrópolis: Vozes, 2012.
WEBER, Max “A ciência como vocação”. In.: WEBER, Max: Ciência e Política: Duas Vocações. São Paulo: Cultrix, 1993.
** Aluno do curso de Bacharel em Teologia pela FATHEL – Centro de Formação Integral e aluno do curso de Licenciatura plena em Pedagogia pela UEMS – Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul.
Fonte: Fathel


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